17 de abril de 2021
Ortotanásia busca conforto para pacientes com doenças terminais | A Tarde
Ortotanásia e a morte natural para pacientes com doença terminal foi o tema da matéria publicada pelo Jornal A Tarde (BA) com a participação de Ana Rosa Humia, coordenadora do programa de Cuidados Paliativos da S.O.S. Vida.
Confira a matéria completa.
Desde novembro de 2006, quando publicou a Resolução 1805, o Conselho Federal de Medicina (CFM) prevê a possibilidade de um paciente, ou seu responsável, recusar a aplicação de medidas que posterguem a morte em estágios terminais.
No entanto, quase 14 anos depois, a chamada ortotanásia ainda é alvo de dúvidas, sobretudo por não estar prevista claramente na legislação brasileira.
“É permitido ao médico limitar ou suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, de enfermidade grave e incurável, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal”, estabelece a Resolução do CFM, alvo de ação civil pública do Ministério Público Federal, iniciada em 2007. Três anos depois, a ação foi julgada improcedente, mantendo a validade das definições do conselho.
Coordenadora do programa de cuidados paliativos da S.O.S. Vida, a médica Ana Rosa Humia explica que a definição de ortotanásia é “morte natural para aquele paciente que tem uma doença grave, ameaçadora da vida”.
A morte sem sofrimento
Ela acrescenta que essa morte natural deve acontecer sem sofrimento e sem a adoção de procedimentos desnecessários e/ou não proporcionais à fase da patologia do paciente.
Dessa forma, ressalta Ana Rosa, a decisão pela ortotanásia não implica no abandono dos cuidados médicos, mas na adequação para manter o controle de todos os sintomas.
A profissional esclarece que os procedimentos que serão descartados ou aplicados variam a cada caso, e também de acordo com a fase da doença na qual o paciente esteja.
“Em alguns casos, o paciente pode ainda receber tratamentos que modifiquem o curso da doença”, diz a médica.
Um exemplo é aquele paciente oncológico que recebe quimioterapia para reduzir o tumor e, com isso, ter melhor controle da dor.
Para exemplificar o que pode ser restrito após a decisão pela ortotanásia, Ana Rosa conta que os procedimentos mais incluídos nesse rol são a intubação orotraqueal, para manter a respiração, e a reanimação cardiopulmonar.
Até mesmo a alimentação por vias não naturais pode ser dispensada em casos de ortotanásia, esclarece ela: “Na finitude, você pode dar quilos de comida para a pessoa que esse alimento não vai nutri-la”.
Ela acrescenta que a passagem de sonda, medida mais comum para alimentar a pessoa que já não consegue comer, provoca desconforto e por isso não é interessante em fases terminais.
Medicações que provoquem sofrimento no paciente e não tragam benefícios para o estágio de terminalidade também podem ser suspensas.
“ A gente teve paciente que nesse processo de finitude, dois, três dias antes de morrer, desenvolveu uma infecção. Não fazia mais sentido tratar, pegar acesso, furar o paciente, gerar desconforto que não teria mais resposta”, recorda, enfatizando que a avaliação de cada passo é bastante criteriosa.
De acordo com Ana Rosa, artigos científicos produzidos em diferentes partes do mundo demonstram que a sobrevida dos pacientes terminais é maior quando recebem apenas os cuidados paliativos, sem uso de recursos tecnológicos com foco específico no adiamento da morte.
“Tudo que fazemos é baseado na bioética, e todas as resoluções do CFM que envolvem o tema citam que o médico pode suspender determinados métodos e medicamentos que possam trazer desconforto e sofrimento ao paciente com doença avançada, desde que esse paciente – ou seu responsável – concorde com essa medida”, esclarece.
A médica ressalta que a equipe médica precisa fornecer todas as informações possíveis para que os parentes possam decidir pela adoção ou não de um procedimento que postergue a morte natural de pacientes terminais.
Avaliação para Cuidados Paliativos
“Hoje temos tabelas e indicadores para avaliar se o paciente é candidato ou não para certos procedimentos”, conta a médica, referindo-se à análise que deve ser feita em pacientes que ingressam em UTIs (unidades de terapia intensiva). Ela diz que essa avaliação ainda é pouco freqüente, o que é motivado sobretudo pela presença reduzida dos cuidados paliativos nas graduações em medicina.