13 de dezembro de 2021

“Trabalhos científicos mostram que a desospitalização é benéfica”

Acompanhe a entrevista concedida ao informativo da S.O.S. Vida pela médica nefrologista Helen Souto Siqueira Cardoso, onde ela comenta sobre os benefícios da desospitalização.

Qual a principal atribuição do nefrologista?

É um especialista que cuida de pessoas com doença renal aguda, crônica ou de pessoas com risco de desenvolver lesão renal. Por cuidar de pacientes com maior complexidade na maioria das vezes, o nefrologista acaba sendo um clínico com maior abrangência nas diversas áreas de clínica médica.

Os doentes renais apresentam uma grande diversidade de outras patologias atreladas como doenças ósseas, cardiovasculares, endócrinas, reumatológicas, hematológicas, entre outras.

Como está a situação dos pacientes com problemas renais no Brasil?

É uma doença que tem crescido exponencialmente no Brasil nos últimos anos e sem controle. Isso porque tem havido um aumento de doenças crônicas em geral, como hipertensão e diabetes. É o que chamamos de síndrome metabólica, situação que tomou conta do mundo nos últimos 20 anos e trouxe junto outras doenças.

Médica nefrologista fala sobre os benefícios da desospitalização

Esses pacientes têm perfil para Home Care?

Sim. A doença renal crônica está ligada à deterioração da saúde dos pacientes, que muitas vezes são idosos, diabéticos, hipertensos, com sequelas de AVC (Acidente Vascular Cerebral), acamados e com muitas limitações. Em outras situações, pacientes com lesão renal aguda pós agravos graves, traumas, cirurgias extensas e internações prolongadas em UTI também são acompanhados pela nefrologia.

Em qualquer um dos cenários, temos pacientes elegíveis para continuidade do tratamento com a assistência domiciliar. Nos últimos dois anos, em razão da pandemia pelo COVID-19, houve uma demanda aumentada de home care e hemodiálise domiciliar para pacientes renais crônicos frágeis e acamados. Terapias que antes eram feitas em clínicas passaram para o domicílio.

Qual a sua visão sobre Home Care?

Sou totalmente a favor. Temos trabalhos científicos mostrando que a desospitalização é benéfica para qualquer paciente de qualquer patologia. Estudos mostram que um indivíduo com mais de 10 dias de internação pode perder até 10 anos de musculatura, sem contar os danos psicológicos, orgânicos e emocionais. O fato de existir um suporte domiciliar pode melhorar a qualidade de vida, a musculatura e a nutrição. O suporte domiciliar, no caso de doentes renais crônicos, é perfeitamente possível na residência.

Vou dar o exemplo da hemodiálise, que há pouco tempo era algo complexo e inimaginável de se fazer em casa e hoje já é factível e exequível. Posso citar outros exemplos, como pacientes que precisam terminar o uso de um determinado antibiótico, indivíduos que precisam de assistência respiratória e oxigenioterapia, fisioterapia ou suporte nutricional. A recuperação é bem melhor, pois ele está em convívio com familiares, em ambiente calmo e seguro. Sou muito a favor.

Leita também: Os benefícios da Atenção Domiciliar | Rádio Excelsior

Em sua unidade de saúde como se dá a desospitalização?

Existem pacientes que já na admissão da internação identificamos, por meio de escores, se eles são elegíveis para Home Care. Essa avaliação é feita por equipe multidisciplinar, envolvendo médicos, enfermagem, nutrição, farmácia, fonoaudiologia e fisioterapia. Geralmente são indivíduos dependentes, acamados e desnutridos, a maioria idosos. Quando chegam, já conseguimos classificar. Caso preencha o perfil, ele fica em tratamento até o momento oportuno e de segurança clínica, em que solicitamos, via operadoras, o apoio para a assistência domiciliar.

Existem também aqueles pacientes que chegam com problemas graves e vão direto para a UTI. Avaliamos a resposta à terapêutica e, caso preencham os requisitos, encaminhamos também para internação domiciliar quando o quadro estiver estabilizado.

Quero lembrar que no Hospital Águas Claras existe um trabalho multidisciplinar. Não é só o médico que faz essa avaliação. Toda a equipe, formada por fisioterapeutas, psicólogos, nutricionistas, fonoaudiólogos, enfermeiros, farmacêuticos e assistentes sociais, discute cada caso individualmente antes de recomendar ou não a continuidade do tratamento em casa, formalizando a solicitação.

De que forma a pandemia afetou a desospitalização?

No início tivemos grandes dificuldades porque os familiares não queriam a alta hospitalar do parente acometido por COVID-19 com medo de não conseguir manejá-lo ou cuidar do parente em casa.

O paciente internava sozinho, sem o apoio familiar, e isso acarretava danos psicológicos e emocionais, além dos agravos gerados pelo vírus. Muitas coisas que dividíamos com as famílias, no cuidado diário e decisões compartilhadas dos tratamentos, foram suspensas e os pacientes ficaram mais solitários. Nos últimos anos avançamos muito no modelo de aproximar as famílias do hospital no cuidado com o paciente; o que, devido à pandemia, inicialmente, houve uma dificuldade devido a restrição da presença de acompanhantes.

Qual o cenário de futuro com a volta, aos poucos, da vida ao normal?

Acredito que avançamos bastante no entendimento de vários aspectos envolvendo a pandemia. Apesar de tudo, tivemos coisas positivas, como a capacitação de equipes online e organização de fluxos complexos em tempo recorde. Estamos mais maduros sobre os pacientes que devem ser desospitalizados mais rapidamente,e podemos explicar melhor e ensinar às famílias os cuidados que precisam ter em casa e que o risco é muito menor na residência. Com segurança, é possível tratar alguns pacientes em casa e deixar os recursos hospitalares para quem realmente tem uma doença grave, que exige equipamentos de alta complexidade.

Dra. Helen Souto Siqueira Cardoso

helen cardoso neurologista

*Helen Souto Siqueira Cardoso é médica graduada pela Universidade Federal de Uberlândia, com especialização em Nefrologia pela Escola Paulista de Medicina. Possui o título de especialista pela Associação Médica Brasileira e Sociedade Brasileira de Nefrologia. É coordenadora do Serviço de Transplante e Nefrologia do Instituto de Cardiologia do DF e do Serviço de internação do Hospital Brasília, unidade de Águas Claras.

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